O ministro do Supremo, Alexandre de Moraes Foto: Carlos Moura/SCO/STF

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), pode entrar na mira de uma das legislações mais severas dos Estados Unidos: a Lei Global Magnitsky. A possibilidade foi levantada pelo senador Marco Rubio, secretário de Estado dos EUA, durante uma declaração nesta quarta-feira (28/5), ao anunciar futuras sanções contra autoridades estrangeiras que, segundo ele, têm atuado para “censurar americanos”.

“Cúmplices de censura a americanos”

Rubio afirmou que o governo americano anunciará em breve restrições de visto para estrangeiros envolvidos em violações à liberdade de expressão de cidadãos dos EUA.

“Estrangeiros que atuam para minar os direitos dos americanos não devem desfrutar do privilégio de viajar para o nosso país”, declarou.
“Seja na América Latina, na Europa ou em qualquer outro lugar, os dias de tratamento passivo para aqueles que atentam contra os direitos dos americanos acabaram.”

Apesar de não citar nomes diretamente, Rubio havia mencionado na semana anterior, em audiência no Congresso, que o governo dos EUA analisa sanções contra Alexandre de Moraes, com base na Lei Magnitsky — que permite punir autoridades acusadas de corrupção ou graves violações de direitos humanos, como tortura, execuções extrajudiciais, prisões arbitrárias e desaparecimentos forçados.

Articulação política com envolvimento brasileiro

A fala de Rubio foi em resposta a uma pergunta do deputado republicano Cory Mills, que tem articulado o tema com Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente Jair Bolsonaro e atualmente residente nos EUA.

Enquanto isso, o STF abriu um inquérito para investigar o próprio Mills, após pedido da Procuradoria-Geral da República, em razão de sua atuação política nos EUA contra autoridades brasileiras.

O que Moraes pode perder se for sancionado?

Caso as sanções se concretizem, três medidas principais podem ser impostas a Moraes:

  • Proibição de entrada nos Estados Unidos;
  • Congelamento de bens em território americano;
  • Proibição de transações econômicas com empresas ou pessoas dos EUA.

É essa última medida que tende a ter os impactos mais profundos. A advogada Natalia Kubesch, da organização britânica Redress, explica que empresas financeiras americanas — como Visa, MasterCard e American Express — podem, sim, bloquear cartões de crédito ou encerrar contas, mesmo que emitidas no Brasil.

Há precedentes. “A American Express já encerrou contas de clientes sancionados, como pessoas ligadas ao governo do Irã”, disse Kubesch à BBC News Brasil. Em 2022, empresas de cartão também bloquearam bancos russos após sanções.

Redes sociais podem ser afetadas?

Outro ponto sensível é o uso de redes sociais. Plataformas como Google, Meta (Facebook, Instagram) e X (ex-Twitter), todas sediadas nos EUA, poderiam restringir ou remover contas de Moraes?

Kubesch aponta uma “zona jurídica cinzenta”. Embora sanções não obriguem diretamente essas plataformas a agir, já houve casos de bloqueios proativos, como o do líder checheno Ramzan Kadyrov em 2017, após sanções.

“Redes sociais podem considerar, por conta própria, bloquear o acesso de sancionados, mesmo sem exigência legal direta.”

Sanção tem peso político — e jurídico limitado

Kubesch ressalta que a aplicação da Lei Magnitsky envolve uma combinação de critérios jurídicos e decisões políticas.

“É necessário haver violação grave de direitos humanos, mas a imposição da sanção é, em última instância, uma escolha do governo americano.”

Para o advogado Jean Menezes de Aguiar, professor da FGV, Moraes não se enquadra tecnicamente nos critérios da lei. Ele também defende que uma eventual sanção não afetaria a legitimidade de seus processos no STF, nem daria base jurídica para afastá-lo de suas relatorias.

Além disso, a legislação americana não tem alcance direto sobre bens em outros países, como lembra o especialista.

Impacto vai além do financeiro

Desde que foi ampliada em 2016, a Lei Magnitsky tem sido usada para punir uma média de 75 pessoas por ano por violações graves ou corrupção, segundo a organização Human Rights First. O impacto, no entanto, varia amplamente.

Um estudo do International Lawyers Project identificou que sanções podem resultar em:

  • Encerramento de contas por bancos estrangeiros;
  • Perda de influência política no país de origem;
  • Investigações internas motivadas pela pressão internacional.

Exemplos concretos ajudam a ilustrar o potencial alcance:

  • O senador dominicano Félix Bautista relatou que não conseguiu mais operar suas empresas após a sanção, além de ter visto os vistos americanos de seus filhos cancelados;
  • Já o vice-presidente do Sudão do Sul, Benjamin Bol Mel, não sofreu consequências relevantes, mesmo após sanções.

Moraes fora do padrão comum da lei

Kubesch observa que Moraes provavelmente não seria alvo da Lei Magnitsky em países como Reino Unido, Canadá ou União Europeia, onde os critérios para sanção são mais restritos.

“Lá, só se aplica a casos como tortura, assassinato ou escravidão. Nenhum desses parece se aplicar ao caso do ministro brasileiro.”

Ela destaca ainda que o governo dos EUA tem mudado critérios de aplicação sob nova gestão — alguns nomes incluídos por Joe Biden foram removidos por Donald Trump.

A eventual sanção contra Alexandre de Moraes pelos EUA ainda é especulativa, mas levanta um debate inédito sobre a interseção entre jurisdição internacional, política interna e liberdade de expressão.
Se concretizada, poderia ter efeitos simbólicos, financeiros e diplomáticos — mas não abalaria sua atuação no STF.

Fonte: BBC News Brasil

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *